reencontros
Um instante de dois
Sem mais, nem pra depois eu te dizer
Que eu te amo
não te amo
demais
(cibelle)


Ela pensou que o melhor mesmo seria reencontrá-lo num lugar comum. Ela imaginou, primeiro, uma locadora, mas ela não freqüentava locadoras, então, pensou que talvez pudesse esbarrar com ele na banca de cigarros da esquina. A carteira cairia no chão, junto com algumas moedas do troco e ela poderia estar desarmada o suficiente para reconhecê-lo após catar tudo do chão e dizer um oi amarelo cheia de suor no rosto e nada mais restaria do que aquele tudo bom que se responde com tudo bem.
Pensou mais tarde que talvez desse certo se o reencontrasse no café do museu. Ela estaria sozinha, como toda quarta-feira, a olhar o painel de cortiça com panfletos de festas, cursos e publicidades diversas, do jeito mais ela que poderia haver, com as pernas como tesouras, as mãos a segurar as cadeiras, algum balanço no corpo e um olhar perdido pregado nos papéis.
Ele se aproximaria, com uma vaga idéia de que ela era ela, e diria o seu nome, em tom de confirmação, com um “né?” no final da frase. Ela, surpreendentemente sem qualquer sinal de sobressalto, diria “é”, com algum riso, sem que, no entanto, dissesse o nome dele em troca. Devolveria apenas um oi breve e possivelmente continuaria na mesma posição que ele a encontrou, exceto pelo rosto, que mesmo assim o ofereceria nada mais que um canto de olho. Afinal de contas, ela não daria nenhuma bandeira, nenhuma (!).
Ele perguntaria qual filme iria assistir, se estava gostando da cidade e o que estava fazendo da vida além de ir ao café do museu toda quarta-feira. Ela responderia com monossílabos simpáticos, mas – já sabia – não resistiria a irrelevantes confissões-de-uma-frase-só como de que aquela era sua parte preferida na cidade e de que ia ao café do museu toda quarta-feira.
Jamais, porém – pensou como se repreendesse a si mesma – ele voltaria a vê-la tão nua, como da primeira vez. E antes que ele dissesse que qualquer quarta-feira dessas poderiam pegar um cinema juntos e, falsamente, como no último encontro, prometesse escrever para o seu endereço, ela o cortaria no meio da próxima frase, se desculpando, naturalmente, mas dizendo que precisava ir, pois sua sessão iria começar. Daria nada mais do que tchau e riso curto, e sumiria do café tão rapidamente que o deixaria imóvel por instantes, engasgado pelo resto de interrogação.
Mas se um dia – cogitou – ah, se um dia o Acaso se distraísse e ela o reencontrasse numa locadora, na prateleira dos filmes nacionais?! Obstinadamente, dar-lhe-ia um segundo seu e pediria um segundo dele para, pensou em voz alta que nem promessa, “embriagarmo-nus em outro instante de dois”.