16 – O retorno

“Agora eu nasço lá de fora” *

Fui admitida, permitida de voltar oficialmente à torre. Transitava novamente entre os vidros blindados do castelo universitário e os jardins tão livres ao seu redor povoados de calangos. Eu me surpreendia em como a torre era outra e ao mesmo tempo era mesma, sobretudo no que se referia a presença de calangos no campos. Mas dessa vez eu estava do outro lado, de caneta vermelha na mão. Eu era a mestre de obras no palco das salas de aulas e tinha a árdua missão de desestabilizar a rígida polifonia daquela babel, propondo, sempre que não me doía os hematomas, o exercício de nos desequilibrar e cair. Mas eu estava do outro lado, de caneta vermelha na mão e comecei foi a sentir saudade de ser eu a aluna, de ser eu quem ouve e não é obrigada a dizer, de ter aquela liberdade das possibilidades infinitas. Na juventude se tem a falsa impressão de que se pode escolher o destino. Escrevi a vida a lápis antes dos vinte e cinco. Agora, com a caneta empostada, impossível de rasura ou borracha, passo a limpo uma história... uma versão da história para ser impressa. E tenho uma saudade eterna de todos os esboços e rascunhos. Tenho saudade do futuro escrito a lápis e por isso incessantemente reescrito. Reescrever era o barato. Agora algum futuro chegou e algumas dessas frases estão a caneta. É hora de imprimir alguma vida.